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A exemplo do bem-te-vi a família não desistiu do semiárido
09/07/2014
“Até os passarinhos estão voltando pra cá agora” comemora Seu Rafael interrompido por Dona Terezinha que complementa numa felicidade só: “Aqui eles acham o que comer de sobra, porque tem repolho, beterraba, pimentão, alface, cebolinha, coentro, salsa, abóbora... e tem a pimenta que os passarinhos adoram! Ah! Tem também o quiabo, tomate, aipim, maxixão, melancia, acerola, milho, couve, maracujá e outras coisas que eles gostam”, enfatiza.
O retorno de várias espécies de pássaros, dentre eles o bem-te-vi, atraídos pela diversidade de alimentos produzidos no quintal da Fazenda Lagoa dos Bois, situada no povoado de Mandápolis, município baiano de Retirolandia, é agora comemorada pelo casal de proprietários. Mas nem sempre foi assim, como conta o agricultor e ex-caminhoneiro Rafael Silvestre Carneiro: “Sempre tive vontade de ter o meu quintal produtivo. Eu era motorista de caminhão e deixei. Depois coloquei a horta, tive vontade de largar tudo, já tava desistindo porque tudo que plantava não ia pra frente por falta da água”.
Assim como o bem-te-vi que defende seu território vigorosamente e que está sempre descobrindo novas formas de alimento, Seu Rafael percebeu que precisava aprender a conviver bem com o semiárido. E aprendeu que isso é possível com o acesso e o manejo sustentáveis da terra e da água para produção de alimentos. Seu Rafael e sua família agora fazem parte do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e em agosto de 2013 foram contemplados com uma cisterna-calçadão.
Avô do pequeno Ruan de 04 anos e sempre ao lado de sua esposa Terezinha de Oliveira Carneiro, mãe dos seus três filhos, Rafaela com 27 anos, Caroniele com 18 e Higor Gabriel com 08, participou do curso de Gestão da Água para a Produção de Alimentos (GAPA). O GAPA promove troca de conhecimentos quanto ao manejo adequado (capacitação, armazenamento e uso) dos recursos hídricos e produção de alimentos agroecológicos. O curso também discute com a comunidade sobre a importância da participação cidadã para defesa e proteção do meio ambiente, sobre as novas tecnologias de convivência com o semiárido e promove momentos de reflexão sobre as estratégias de manuseio e gestão das águas disponíveis em seus sistemas de produção, para além das construídas pelo projeto.
Aprendizagem e Trabalho
“No GAPA, aprendi muita coisa. Antes plantava com água da Embasa que ia buscar no povoado de Mandápolis e perdia muito porque sapecava tudo com o cloro, perdia cem por cento às vezes por causa do cloro. No curso aprendi tudo sobre o uso da água, a fazer os canteiros, até o canteiro econômico”, conta. E como a maestria do bem-te-vi que tem um importante papel na distribuição de sementes, continua Seu Rafael: “Aprendi como adubar, a plantar, pois não tinha experiência para plantar, não sabia o tanto de veneno que a gente comia. Esse veneno não me mata mais não. Hoje adubo com resíduos de sisal e com a terra da quixaba, tudo natural”, comenta com sua aprendizagem agroecológica adquirida no curso.
Dona Terezinha, que nasceu e sempre morou na roça, trabalhando e estudando ao mesmo tempo, diz que sempre ensinou seus filhos a gostarem da terra que lhes dão o sustento. “Gosto daqui e depois da cisterna aprendemos que colocando adubo e molhando, tudo que planta aqui colhe”, e complementa: “Todos que ganham a cisterna precisam trabalhar senão ela sozinha não faz milagre. Tem que unir a tecnologia e o trabalho para ter sucesso como nós tivemos”, enfatiza.
O sucesso que Dona Terezinha fala é a comercialização dos produtos produzidos no próprio quintal. “Daqui tiramos o sustento, vendemos nossa produção para pagar nossas despesas, ajudar nossos filhos, é uma renda extra e também é uma terapia para a mente. Antes eu ficava sem fazer nada, batia uma tristeza, mas agora não! Tenho muito que fazer... limpar, colher, plantar, vender, precisa coisa melhor?”, conclui com orgulho e semelhança ao casal de bem-te-vi que além de construir o ninho onde vive, dividir as tarefas de cuidar da prole, ainda é um dos primeiros pássaros a cantar ao amanhecer no semiárido.
NOTA:
A história de Seu Rafael e sua família serviu de inspiração para o boletim impresso O Candeeiro que é uma das ferramentas usadas pelo Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) como um importante instrumento de divulgação de iniciativas bem-sucedidas na convivência com o Semiárido. O Candeeiro é uma das sistematizações do Programa que conta histórias de vida dos/as agricultores/as, como seus saberes e conhecimentos adquiridos contribuem para o fortalecimento dos seus sistemas de produção, geração de renda, segurança alimentar e nutricional.
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