A arte do barro: uma transformação social, cultural e coletiva na Comunidade de Sitio Santana

05/08/2014

A Associação Comunitária de Artesãos de Sítio Santana é um reflexo de união, participação popular e cultural. Originários de uma comunidade reconhecida quilombola a população expressa através da arte em barro a valorização de características culturais e coletivas da comunidade de Sítio Santana do município de Lamarão na Bahia. Para uma das líderes da associação, Jaciara Carvalho de Almeida, 36 anos, conhecida como Bia, usar o barro mostrou as pessoas da comunidade a melhor forma de valorizar o lugar onde todos e todas vivem além de mobilizar o coletivo. 

“Antes cada uma trabalhava em suas casas e as artesãs mais velhas viram a necessidade de trabalhar juntas. Tivemos visitas do artesanato solidário do município de Lamarão que nos descobriram e daí então a gente começou a andar. Fizemos reuniões sempre no fundo da escola, porque a gente não podia deixar nossos filhos sem aula, e começamos a fundar a associação. Para nós isso foi muito importante, pois o trabalho coletivo interage com o outro e assim a gente pode gerar renda para as famílias. A ideia da associação mudou demais a nossa vida”, fala Bia.

A associação foi fundada em 2004, atualmente com sede própria e com um espaço dividido em salas, cozinha, banheiros e biblioteca adquirida através de projetos, Bia ressalva que “tudo que a gente tem hoje é para o nosso benefício. A gente não perde mais tantas peças como antes. Tudo fica guardado aqui. Temos cozinha pra quem quer cozinhar, a biblioteca que conseguimos com a Fundação Pedro Calmon que é pra toda comunidade usar, então hoje pra a comunidade de Sítio Santana nossa associação é uma grande referência”.

“O produto para produzir as frigideiras, panelas, tachos e potes, que é o nosso carro chefe, a gente tem aqui mesmo na nossa comunidade. Uma das mulheres que faz parte da associação tem em sua propriedade a argila e ela nos cede. Nossos produtos são utilitários e a gente faz o possível pra produzir peças com muita qualidade. O processo do barro é da seguinte forma: a gente pega o barro molha uns três dias pra ele amolecer, amaça, molda e pra finalizar a gente usa uma argila mais fina que vai deixar as peças mais lisas.

É preciso tirar o excesso de água que leva de 8 até 15 dias pra secar e depois vai queimar no forno colocando a lenha aos pouco pra não perder o ponto . E pra melhorar o trabalho a gente usa algumas ferramentas como borracha da sandália, o bico do boné que a gente recicla e serve como uma palheta pra moldar a peça e daí por diante depende muito do clima”, acrescenta Jacira.

A fabricação de peças com argila é alternativa de renda para as 21 artesãs e sua famílias. “A nossa comunidade não tem trabalho para todos e muitos de nossos maridos saem para trabalhar fora. Em nossa comunidade a maioria é agricultor e agricultora e nem todo ano as coisas que a gente planta dá, então pra nós é uma grande forma de procurar melhorar nossa vida e é através do barro que a gente consegue recursos e assim vamos indo e até porque nós somos mulher fortes e não podemos fraquejar diante de nenhuma situação”, completa Bia.

O grupo de produção vende pra fora da comunidade e segundo Bia ainda falta mais oportunidades. “A gente além de vender na comunidade, vende também em outros municípios nas feiras livres, feiras de artesanato. Temos uma parceria com o Instituto Mauá que sempre no ano compra nossos produtos e isso é também uma forma de divulgar o que nós fazemos com as feiras que o pessoal do instituto nos leva. Mas ainda falta à gente sair pra outros estados e promover nossos produtos, divulgar ainda mais o que a gente consegue produzir”. 

Para Bia um dos maiores desafios está na sensibilização de jovens nas atividades da  comunidade, uma vez que o grupo de artesãs promove a cultura e o desenvolvimento local, “a gente promove aqui muito mais que renda a partir do barro. Aqui em Sítio Santana a gente faz com que a cultura do samba de roda e os trabalhos de nossos ancestrais não se percam. Nosso desafio maior hoje é inserir os jovens nos trabalhos de nossa comunidade. Porque as nossas raízes culturais, a nossa arte não pode se perder e os jovens hoje são as figuras importantes para não deixar morrer o que nossa geração foi construindo aos poucos”. Segundo ela as manifestações culturais são as peças fundamentais para o reconhecimento e identidade de um povo que expressa diariamente sua cultura. Outro desafio para a entidade “é ter pessoas qualificadas e capacitadas que consigam elaborar projetos e busquem melhorias para a nossa comunidade”.

Diante de muitas transformações que já aconteceram em Sítio Santana muitas ainda podem vir. “Depois que eu comecei a participar da associação eu só tinha até a sexta série e depois de cursos e viagens que eu participei percebi a necessidade de contribuir ainda mais. Decidi voltar a estudar e puxei outros alunos na época só tinha 12 e vinha uma combis e hoje o pessoal vai no ônibus porque já tem muita gente estudando e buscando melhorias. E pra mim é motivo de muito orgulho ver que a partir de uma iniciativa mudou a vida de muitos tantos outros”.
 




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