Flores refletem alegria no Semiárido

30/12/2014
Flores refletem alegria no Semiárido

As flores plantadas perto da casa são o reflexo da alegria que hoje reina no lar de Dona Merentina, 63 anos, produtora rural da comunidade de Malhada da Areia, distante 35 km da sede do município baiano de Araci.
 
Todos os dias Dona Meretina Romana e seu esposo Sérgio Bispo, acordam ainda madrugada por volta das cinco horas, acendem o fogo e antes mesmo do café da manhã, contemplam a beleza das flores e vão regar as hortaliças e verduras que crescem em canteiros construídos por eles, ao lado da cisterna instalada perto da casa. Mas nem sempre foi assim. Com vinte e um netos e pais de onze filhos, desde muito cedo vencem desafios. 
 
“Antes de morar aqui, há uns trinta anos atrás morava numa roça em Barrocas. Lá tive os primeiros filhos e trabalhava até em motor de sisal para criar os meninos. Também trabalhei nas roças dos outros e ia criando os filhos assim”, diz Dona Merentina sem estampar no rosto seu largo e costumeiro sorriso. “Depois viemos pra cá e a família e a despesa foi aumentando. Já fiz chapéu de palha pra vender, eu e Sérgio plantava umas coisinhas no quintal pra dá o de comer aos meninos, mas em tempo sem chuva se perdia tudo”, lembra.
 
O filho Denílson, que até então ouvia tudo calado, interrompe a mãe: “Acho que a vida dos meus pais melhorou muito de uns tempos pra cá. Já tivemos casa até de pindoba. Um ovo agente divida pra muitos, mas agora tá tudo melhor. A gente pagava pela água até pra beber. Tinha que buscar pelo carro pipa em Araci, ou pagava alguém pra trazer a água aqui. A cisterna mudou pra melhor. As chuvas também melhorou. Sem água não se vive. Com fome se aguenta passar, mas de sede não passa nem dois dias”, argumentou enquanto trazia no colo sua filhinha ainda bebê.
 
Denílson, muito à vontade, foi quem falou sobre o processo de implantação da cisterna enxurrada, do Programa Mais Água, desenvolvido em parceria com a Articulação Semiárido Brasileiro – ASA, com a Secretária de Desenvolvimento e Combate a Pobreza do Estado da Bahia – SEDES e com o Movimento de Organização Comunitária – MOC.   Disse que tudo começou com a visita do técnico Francisco e com os cursos que Dona Merentina fez, mas que chegou a duvidar que acontecesse a implantação da cisterna: “Só acreditei quando vi a máquina aqui. Tinha dito pra mãe que esse negócio não vinha pra cá, mas veio em agosto de 2013. Aí já tava largando mesmo meu trabalho em Salvador, larguei de vez e vim ajudar na construção da cisterna. Fizemos numas três semanas”, conta orgulhoso do feito enquanto o pai, Seu Sérgio, balançava a cabeça em gesto de afirmação.
 
Aprendendo a conviver
As famílias atendidas nos municípios são formadas para o gerenciamento, conservação e utilização sustentável das estruturas hídricas, bem como para dinamizar a produção agroecológica e solidária. A metodologia de troca de experiência também estará presente no projeto, onde são desenvolvidos encontros de intercâmbios entre agricultores e agricultoras, possibilitando a troca de saberes e adoção de práticas agroecológicas e de convivência com semiárido.
 
Dona Merentina confessa que não foi fácil. “Fui e vou pra tudo que é reunião, viagem e curso que tem. Aprendo depois ensino a Sérgio. Ele e algumas filhas ajudam. O mais certo é nós dois. Antes lutava com as verdura daquele canteirinho de lá de cima, mas não rendia. Não tinha água, não sabia como plantar, fazer o canteiro econômico, inseticida natural... Francisco é legal com a gente, vem orientar a gente. Sai com a gente pros lugar e toma conta de nós do principio ao fim”, diz enquanto o técnico Francisco escuta emocionado.
 
Agora é Francisco quem fala: “Dona Merentina não perde um evento. É uma das mais alegres do grupo sempre puxa as cantigas de roda, anima todo mundo. Fico feliz por ela ter conseguido proporcionar a segurança alimentar e nutricional da sua família e vir garantindo uma renda extra com a comercialização de alguns produtos que sobram e que ela vende na sede do Sindicato de Trabalhadores Rurais da comunidade, junto com mais cinco produtoras da vizinhança”, enfatiza. Numa gargalhada invejável, Dona Merentina toda envaidecida retruca: “Começamos a vender pra as vizinhas e levei para experimentar a vender lá e agora quando eu não vou o pessoal vem é aqui buscar. Né Sérgio?”, fala muito feliz num semblante de vitória. 
 
Com quantos momentos de superação se constrói um casal de agricultores? Infinitos, é a resposta no caso de Dona Merentina Romana e Seu Sérgio Bispo que deixa a seguinte mensagem: “É possível viver, aprender a plantar, ter sempre o milho, o feijão, batata, as hortaliças e verduras, tudo sem veneno, mas não gastar muita água não, porque é pra guardar pro tempo seco”, e termina a prosa pedindo para ser fotografada com os poucos filhos e netos que ali estavam, entre as flores do seu cantinho predileto.