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"A ASA é uma das paixões da minha vida"
16/03/2010
No período de 22 a 26 de março será realizado na cidade de Juazeiro, na Bahia, o VII Encontro da Articulação no Semi-Árido Brasileiro, EnconASA. Naidison Baptista, secretário executivo do MOC, fala sobre o que mudou no semiárido desde a criação da Articulação há dez anos atrás e o significado da caminhada que vai reunir centenas de homens e mulheres para celebrar as conquistas, mas também, denunciar as políticas que ameaçam a população do semiárido. Emocionado, ele revela que a ASA é uma das paixões de sua vida.
Programa de Comunicação (PCOM) - Nos próximos dias a Bahia será palco da celebração dos 10 anos da Articulação no Semi-árido Brasileiro. O que mudou no semiárido desde a criação da ASA?
Naidison Baptista - Mudou muita coisa e essa muita coisa que mudou é pouca. Mudou inicialmente a maneira de ser vê e de se olhar o semiárido. Não se olha mais ou se olha menos o semiárido como aquela terra seca, esturricada, faminta, cheia de miseráveis que precisa de esmolas, de ajuda, que precisa de doações. Ao invés disso, se fala do semiárido como seus habitantes sendo sujeitos de direitos, terra viável desde que a ele sejam dirigidas políticas adequadas ao seu modo de ser, ao seu clima, ao seu povo, às suas circunstâncias. Isso é uma mudança que diz respeito à concepção de ser vê o semiárido. Isso é muito importante. A gente vê o Brasil de fora a fora colocando essa concepção em pauta. Outros elementos importantes são as questões que foram concretizadas dentro desse modo de ser novo do semiárido. A gente pode falar das cisternas de consumo humano. Se a gente olha 340 mil cisternas, nós vamos falar em quase um milhão e setecentas mil pessoas livres do carro-pipa, livres da dependência de buscar nos políticos um copo de água e vincular o seu voto, que vêem atendidos os seus direitos de cidadania. A gente olha a educação contextualizada dentro de uma perspectiva de semiárido que começa a invadir as escolas públicas municipais e estaduais. A gente olha um conjunto de elementos de assistência técnica que se colocam na perspectiva adequada ao semiárido. A gente olha também cisternas de produção, tanques de pedra, barragens subterrâneas e outras tecnologias que são de domínio popular, que são criadas pela população e que hoje, gradativamente, vão se tornando em políticas. São dez anos de bons resultados e que apontam para uma dimensão muito maior de inserção cidadã, justa e eqüitativa do semiárido.
PCOM - Nestes dez anos, como o senhor avalia a atuação das organizações da sociedade civil que integram a Articulação?
Naidison Baptista - Eu acho que em princípio é uma ação positiva. Falam em 800, eu falo hoje em mais de três mil, porque se a gente avaliar que cada comissão municipal tem no mínimo três integrantes e que nós estamos em mais de mil municípios, nós temos 3 mil organizações de base que estão envolvidas só com o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC). São 3 mil organizações que debatem os critérios, que debatem os processos que interferem na execução do programa, que têm o programa como seu. Isso é uma rede imensa, muito significativa. E muitas delas fazem isso pela sua própria missão porque não recebem recurso para isso, recebem a tarefa, estão envolvidas, querem fazer e estão no processo. Então nós temos muito mais de 3 mil organizações fazendo isso. Ao lado disso nós temos hoje mais de 80 organizações que são o lastro dos dois programas da ASA, o P1MC e o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), são organizações que celebram convênios com a Associação Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC) e são responsáveis nos seus territórios, nas suas regiões por dinamizar o P1MC e P1+2, naturalmente a partir das comissões regionais e das comissões municipais. Muita gente fala e eu concordo que a ASA é uma das redes mais bem sucedidas no Brasil porque ao lado de debater as questões, de ter propostas, de ter debates políticos, a ASA implementa as questões que ela debate e isso é importante, isso dá vida às pessoas e às regiões.
PCOM - Em sua 7º edição o EnconASA tem como tema “ASA – 10 anos construindo o futuro e a cidadania no semiárido”. Quais as novas perspectivas de convivência com o semiárido diante do atual contexto sócio-político e econômico?
Naidison Baptista - O EnconASA vai debate isto a partir de alguns temas, como economia solidária, educação contextualizada, agroecologia e a biodiversidade, acesso à água para produção, acesso à água para consumo. São sete temas onde os participantes do EnconASA vão primeiro visitar experiências relativas a estes temas, depois trabalhar oficinas sobres estas visitas e nestas oficinas teremos debatedores que são especialistas nos temas e a missão desses debatedores é justamente questionar, aprofundar essas experiências para a partir disso se projetar a construção de políticas. Eu avalio que o grande desafio da ASA não é mais mostrar que ela é capaz de fazer, mas, é sair fora de suas experiências e a partir de suas experiências construir políticas. O grande desafio da ASA hoje é vê como ela amplia a experiência de educação contextualizada, como ela se insere e se coordena com outras redes para ampliar o processo de economia solidária, de assistência técnica agroecológica. Então nós temos desafios enormes no semiárido que não são apenas a questão da água, que nós precisamos encarar conjuntamente com o governo e conjuntamente com outras organizações da sociedade civil.
PCOM - Na tarde do dia 23 de março os delegados do VII EnconASA participam da caminhada do semiárido. Em que consiste esta caminhada, o que os moradores de Juazeiro podem esperar?
Naidison Baptista - A caminhada é o momento solene do EnconASA. A gente poderia dizer que é a abertura pública do EnconASA, com a participação de todas as pessoas da cidade de Juazeiro que quiserem e que são bem-vindas a trabalhar conosco esta perspectiva. A caminhada tem dois vieses. Um viés é tornar público o que nós conquistamos em termos de agroecologia, de assistência técnica, de acesso à água para produção. Essas coisas existem, mas elas estão escondidas e é importante que elas sejam públicas para que as pessoas possam enxergar o que de bom, de positivo, importante existe no semiárido. A caminhada neste sentido é um momento de celebração. Mas toda celebração tem dentro de si um momento de denúncia. Nós vamos denunciar as mazelas que estão aí feitas ainda no semiárido, e que tornam do semiárido uma terra inviável. Vamos denunciar as políticas com as quais nós não concordamos, políticas que concentram água, que concentram terra, riquezas, saber nas mãos dos poucos e dos mesmos e que deixam à margem da sociedade as milhares de pessoas que vivem no semiárido. Então a caminhada são estas duas coisas, momento de alegria, de celebração, e momento de denúncia das questões que inviabilizam o semiárido e apontando as pistas para a sua viabilização.
PCOM - O que a ASA significa para o MOC?
Naidison Baptista - Há dez anos atrás quando a ASA foi criada o MOC foi um dos signatários da carta de princípios e do processo de fundação. Na ASA estão colocadas, debatidas, ampliadas muitas das experiências que o MOC já desenvolvia. Eu acho que o grande significado da ASA para o MOC e do MOC para a ASA é que nós nos encontramos na busca de tornar o semiárido viável e de tornar suas pessoas sujeitos de direitos. Nessa caminhada o MOC aprende muito com a ASA, tem muitos elementos que hoje estão incorporados na prática e na proposta do MOC e que não estavam e que aprendemos no convívio, no dia-a-dia com muitas organizações da ASA, e com certeza a ASA cresce e aprende com o MOC porque somos um membro ativo da ASA. Essa mútua interação enriquece a todos nós.
PCOM - Com uma história de vida dedicada ao povo do semiárido, o que a ASA representa em sua vida?
Naidison Baptista - A ASA representa pra mim uma das... Eu poderia dizer que a ASA é uma das paixões da minha vida. Eu falo na ASA, eu debato as questões da ASA, eu vivo as questões da ASA durante o tempo todo da minha vida. É de manhã, é aqui no MOC, é em casa, é buscando opções. Ela preenche muito do que eu acredito, muito do que eu quero, muito do que eu desejo que seja o semiárido, que seja um espaço onde as pessoas sejam sujeitos de direitos e onde as pessoas possam dizer “esse torrão é meu, eu aqui posso ser feliz”. Eu me dedico a construir esta perspectiva, a colaborar para que isto aconteça e isso me faz feliz.
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