Estudos apontam conquistas e desafios para a Educação do Campo

30/07/2014

Há exatos 20 anos tem início na Região do Sisal uma jornada pela construção do conhecimento a partir da realidade de cada comunidade onde as escolas do campo estavam inseridas. Através de um novo projeto inspirado na experiência do Serviço de Tecnologia Alternativa, Organização do Estado de Pernambuco, o MOC, a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e as prefeituras municipais, iriam contribuir para disseminar outra maneira de pensar a educação rural. Era o CAT - Conhecer, Analisar e Transformar a realidade do Campo, que nascia em 1994, atendendo aos municípios de Santo Estevão, Santa Luz e Valente.

A proposta de educar a partir da realidade da comunidade, levando em consideração os aspectos sociais, culturais e ambientais que envolvem a vida da população do campo, era uma perspectiva ousada e ao mesmo tempo transformadora, já que o objetivo era interferir e modificar aquela realidade. Com o passar dos anos o sonho se ampliou. Hoje o CAT está presente em 20 municípios do Território do Sisal e também da Bacia do Jacuípe, e em alguns deles tornou-se uma política pública.

Mesmo com uma caminhada de grandes contribuições na proposição de políticas públicas nos municípios, o CAT e a educação do campo de forma geral ainda enfrentam grandes desafios. Alguns destes desafios foram estudados por pesquisadores que apresentaram seus trabalhos durante seminário realizado pela UEFS. O evento aconteceu na última segunda-feira (28), e contou com a presença de gestores, coordenadores, representantes da sociedade civil, que fizeram parte da mesa de abertura, e a comunidade acadêmica.

Um dos desafios foi apontado na pesquisa de mestrado do professor da rede estadual de ensino Claudiano da Hora de Cristo, ex-estagiário do CAT. Claudiano investiga a formação científica do professor da escola do campo e a contribuição que isso pode trazer para os passos metodológicos do projeto CAT (Conhecer, Analisar e Transformar).

“Pretendo pensar a partir da educação do campo como deve ser o movimento entre o conhecimento da realidade e conhecimento científico, isso a partir da perspectiva da formação do professor. Qual deve ser a sua formação, suas referências pedagógicas, que possibilitem elevar o conhecimento da realidade ao conhecimento científico, para que o aluno e a comunidade compreendam de forma mais crítica a realidade que foi apresentada?” questiona o professor, que pretende responder estas questões ao termino de sua pesquisa que se encontra em andamento.

Outro trabalho que ainda está em fase de elaboração é o da professora Maria de Lourdes Albuquerque (UEFS). A pesquisa de doutorado chama atenção para a importância da extensão universitária na contribuição de mudanças sociais. Ela utiliza o CAT como estudo de caso para mostrar o potencial de intervenção social que os projetos de extensão podem alcançar. Ela propõe instrumentos de avaliação de outros projetos de extensão.

“A partir do momento que um projeto de extensão universitária busca formar professores para transformar homens e mulheres do campo, está presente aí a perspectiva de convivência com o semiárido”, disse Profª Maria de Lourdes.

Política pública – O desafio  A experiência do CAT contribui para mudar vidas e despertar as comunidades para muitas lutas, como relatou André, estudante de Geografia da UEFS. “Eu lutei no meu município pela implantação do PETI [Programa de Erradicação do Trabalho Infantil] e o trabalho do CAT em meu município foi fundamental para gente perceber a importância da educação contextualizada e assim lutar pela permanência do PETI”, afirmou o estudante durante a plenária. 

Mesmo incentivando a comunidade a lutar pelo que acredita e tendo seu potencial reconhecido, o CAT ainda enfrenta o desafio de tornar-se uma política pública. Isso é o que aponta a pesquisa de mestrado de Vera Carneiro, coordenadora da Equipe de Educação do MOC.

A pesquisa investiga o projeto desde a sua origem e os principais conceitos que o envolve, como a concepção de educação do campo e de políticas públicas. Além disso, busca as percepções que os sujeitos envolvidos (professores, coordenadores, gestores, representantes da sociedade civil) têm acerca da importância do CAT e como suas ações contribuíram ao longo desses 20 anos para a construção de políticas nos municípios de Barrocas, Conceição do Coité, Retirolândia, Santa Luz e Valente no Território do Sisal.

O principal questionamento da pesquisa gira em torno da seguinte pergunta: por que o CAT mesmo sendo reconhecido como uma metodologia importante para modificar a realidade ainda não se tornou uma política pública nos municípios?

Segundo a pesquisadora, o trabalho obteve a seguinte resposta. “Os gestores locais ainda não o incorporaram enquanto uma proposta que está aliada a um projeto de desenvolvimento rural e do próprio município. E, por outro lado, os sujeitos mais envolvidos com a proposta, ainda não compreenderam que o CAT precisaria avançar de uma metodologia para uma proposta política pedagógica”, finalizou Vera Carneiro, durante sua apresentação.

Outros trabalhos foram expostos, entre eles os da professora Núbia da Silva Oliveira, que discutiu em um artigo sobre a formação do professor tendo como base as experiências do CAT, e o da professora Luziane Amaral, que analisou as fichas pedagógicas do projeto como instrumento de interação verbal e como circulação de discursos.

O último trabalho apresentado foi da professora Priscila Brasileiro, que pesquisou o professor como agente de letramento na especialização e o processo de resistência ao fechamento de escolas do campo no município de Valente durante o mestrado.  Mães que participavam ativamente do CAT no acompanhamento dos seus filhos enfrentaram a decisão dos gestores do município de fechar a escola (nucleação).

“Percebi que eram mães, mulheres organizadas que viam na escola um grande valor simbólico. As mães estavam envolvidas na origem do CAT nessas escolas, embora elas não tivessem escolarização, lutaram a partir desse sentimento”, relatou Priscila Brasileiro, que assumiu o desafio estudar as classes multisseriadas na pesquisa que irá desenvolver para o doutorado.

 


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